terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

FEMUSC, futebol e carnaval.


Uma partita de Bach tocada na praça de alimentação do Shopping Center Breithaupt vai fazer com que uma pessoa pare de comer para ouvir um violino? Pode ser que ela ao chegar em casa coloque para baixar todas as obras que encontrar disponível na internet, mas certamente não vai comprar nenhum cd. 

Muito interessante são os dados apresentados por William Fischer em seu livro Promises to keep. O autor informa que, de acordo com estudo realizado em 1999, verificou-se que, entre 8 mil músicas baixadas na internet:

- cerca de 15% foram ouvidas apenas uma vez;

- cerca de 50% não foram ouvidas nem mesmo uma vez inteira;

- cerca de 10% jamais foram ouvidas;

- menos de 10% foram ouvidas mais de quatro vezes.

Provavelmente ela vai conversar mais alto com o colega de mesa, ou continue comendo naturalmente.
Volta e meia aparecem e-mails ou compartilhamentos no Facebook a respeito do que aconteceu com o violinista Joshua Bel tocando num metrô de Washington DC.

Um homem sentou-se numa estação de metro de Washington DC e começou a tocar violino, era uma fria manhã de janeiro. Ele tocou seis peças de Bach por aproximadamente 45 minutos. Durante esse tempo, já que era hora de ponta, calcula-se que cerca de 1.100 pessoas atravessaram a estação, a sua maioria, a caminho do trabalho.

Três minutos passaram quando um homem de meia idade notou que o músico estava a tocar, abrandou o passo e parou por alguns segundos, mas continuou depois o seu percurso para não chegar atrasado.

Um minuto depois, o violinista recebeu o seu primeiro dólar, uma senhora atirou o dinheiro sem sequer parar e continuou o seu caminho.

Mais alguns minutos, alguém se encostou à parede para ouvir, mas olhando para o relógio retomou a marcha. Estava claramente atrasado para o trabalho.

Quem prestou mais atenção foi um menino de 3 anos. A mãe trazia-o pela mão, apressada, mas a criança parou para olhar para o violinista. Finalmente, a mãe puxou-o com mais força e o miúdo continuou a andar, virando a cabeça várias vezes para ver o violinista.

Esta ação foi repetida por várias outras crianças. Todos os pais, sem exceção, obrigaram as crianças a prosseguir.

Nos 45 minutos em que o músico tocou, somente 6 pessoas pararam por algum tempo. Cerca de 20 deram-lhe dinheiro mas continuaram no seu passo normal. Ele recebeu cerca de 32 dólares. Quando ele parou de tocar e o silêncio tomou conta do lugar, ninguém se deu conta. Ninguém aplaudiu, nem houve qualquer tipo de reconhecimento.

Ninguém sabia que este violinista era Joshua Bell, um dos mais talentosos músicos do mundo. Ele tocou algumas das peças mais elaboradas alguma vez escritas num violino de 3,5 milhões de dólares.

Dois dias antes de tocar no metrô, Joshua Bell esgotou um teatro em Boston, onde cada lugar custou em média 100 dólares.

Esta é uma história real, Joshua Bell tocou incógnito na estação de metrô num evento organizado pelo Washington Post que fazia parte de uma experiência social sobre percepção, gostos e prioridades.

O outline era: num lugar comum, numa hora inapropriada: Somos capazes de perceber a beleza? Paramos para apreciá-la? Reconhecemos o talento num contexto inesperado?

Uma das possíveis conclusões que se podem sacar desta experiência podem ser: Se não temos um momento para parar e escutar a um dos melhores músicos do mundo tocar algumas das músicas mais bem escritas de sempre, quantas outras coisas estaremos perdendo?

Voltando ao FEMUSC...

Praça de alimentação é lugar para comer, e dificilmente alguém vai mudar isso. Muito menos um músico. E ainda pensar que o músico pagou 400 reais para fazer música de fundo durante o almoço.

Não é a toa que diariamente músicos recebem convites para tocar em qualquer lugar em troca de um prato de comida ou da oportunidade de “divulgar” o seu trabalho.

Esses tipos de ações fazem com que eu tenha que discutir valor de cachê com vendedor de material de construção, porque na visão dele é estranho alguém cobrar para tocar quando tem gente pagando para tocar.

Outro jornal apresentou uma matéria interessante, onde um participante diz que tinha de se virar sozinho para ler a partitura para tocar no FEMUSC. A matéria também diz que esse mesmo participante estava matriculado no nível intermediário.

Ler música para um festival desse nível é elementar!

Já imaginou eu participar de um Fórum de Direito Civil e aprender a ler no primeiro dia do Fórum? Ultimamente eu estou usando essas comparações, a princípio toscas, mas que tem como objetivo mostrar que músico é uma profissão, para que os aspirantes a músico não se iludam com a ideia de que apenas o talento basta.

Música é 1% inspiração e 99% transpiração!

Até parece que todo mundo nasce sabendo a sua hora de tocar na Sagração da Primavera de Stravinsky.
Jaraguá do Sul ainda não tem um corpo musical estável. Temos projetos e projetos tem começo e fim. Eles são elaborados para durarem um determinado período. Não existe projeto infinito. E no final tem de prestar contas!

Um projeto milionário passou pela cidade para criação de uma orquestra sinfônica, mas começando do zero, porque aparentemente, os músicos de Jaraguá não teriam condições de participar da mesma. Nada daqui, segundo esse projeto, poderia ser aproveitado ou investido.

Projetos culturais diferem dos projetos em geral por envolverem insumos de alta qualidade, difíceis de gerir, e por terem retorno financeiro imprevisível, reduzido ou mesmo inexistente (Hermano Roberto Thiry-Cherques).

Sinto-me envergonhado quando converso com colegas músicos de outros estados e países na hora de explicar como Jaraguá do Sul tem um festival de música de 2,4 milhões de reais e não tem uma orquestra. Nem Joinville tem. Blumenau tem uma de câmara.

Santa Catarina tem orquestra sinfônica? A última notícia que eu tive da mesma é que eles tinham sido despejados do local de ensaio por falta de pagamento do aluguel. Agora tem uma Orquestra Sinfônica de Florianópolis.

Há muitos projetos e não custa lembrar que ano passado, que foi ano eleitoral, simplesmente não saiu nenhum edital por parte do governo do estado. Nem Elisabete Anderle, nem SEITEC.

Sobraram aproximadamente 10 milhões de reais por conta desses editais não realizados. Onde parou essa grana?

Parece que os projetos de grande porte só serão desenvolvidos via Lei Rouanet, porque se depender do Estado só haverá editais de cultura em ano sem eleição. Já estão até reformando ponte com projeto via Lei Rouanet.

Esse festival tá criando a cultura do aprenda música em duas semanas, do seja músico nas férias, do aproveite concertos sinfônicos grátis porque o próximo pode ser só ano que vem!

Não é dessa maneira que se forma público para a música erudita.

Mais uma comparação tosca. Ano passado no primeiro jogo do Juventus na série B do Catarinense não havia mil pessoas no estádio. Teve mais foguetes do que pessoas. Já nesse ano, no primeiro jogo do time na série A compareceram mais de 3 mil pessoas e não teve um foguete sequer. Só um rojão jogado pela torcida do Metropolitano na torcida do Juventus.

Teve até briga entre as torcidas. Querendo ou não apenas alguns meses de campeonato foram suficientes para quase lotar um estádio já no primeiro jogo do ano.

Enfim, para mim o FEMUSC virou um luxo desnecessário. É tipo os concertos do André Rieu, é mais visual do que musical.

Para o pessoal que pensa num tema para dissertação de mestrado, ou tese de doutorado, seria interessante um estudo do público de música erudita em Jaraguá do Sul após o primeiro FEMUSC. Aumentou? Diminuiu?

Quando o Festival completar 10 anos vamos fazer a pergunta: Dez anos de FEMUSC em Jaraguá do Sul, qual a sua influência na música e no público local?

Como sou músico da Orquestra Filarmônica de Jaraguá do Sul, na qualidade de membro fundador, duma época que o Teatro da SCAR não tinha poltrona e possuía uma acústica horrível, afirmo que o público da orquestra se manteve fiel e os encerramentos (Auto de Natal) sempre lotaram.

Não senti nenhuma influência do FEMUSC sobre o público da Filarmônica e muito menos sobre os habitantes de Jaraguá do Sul. É tipo o carnaval.

Teve um ex-presidente de Fundação Cultural que disse que iria tornar o carnaval de Jaraguá do Sul referência no estado? 4 anos depois houve alguma evolução no nosso carnaval? Só se nos gastos.

Tem um boneco apodrecendo ao ar livre lá no parque de eventos. O outro foi queimado. 30 mil reais jogados fora e mais outros milhares de reais para manutenção.

Estão substituindo a obra de arte pela febre do evento ‘político-cultural-mediático’, de cuja manipulação dependem liberações de verbas públicas, a sustentação do clientelismo da ‘casta de serviço’ e a expansão da nomenclatura cultural dentro do aparelho do Estado. (Darling Quadros)

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