terça-feira, 27 de março de 2012

O valor do artista (parte 1)


Lendo os dois últimos editais lançados pelo Fundo Municipal de Cultura no dia 21 de março, terça-feira passada, deparei-me com um item curioso:

Edital 01/2012

Capítulo quinto

Art. 15 Serão disponibilizados para fins deste Edital o total de R$ 513.000,00 (quinhentos e treze mil reais).

§2º Não serão aceitas despesas de elaboração, agenciamento e administração dos projetos.

§3º Os proponentes poderão ser remunerados desde que prestem serviço na execução do projeto e que o mesmo esteja especificado no plano de trabalho e seu valor não ultrapasse 10% do valor total do projeto.


Edital 02/2012

Art. 15 Serão disponibilizados para fins deste Edital o total de R$ 495.000,00 (quatrocentos e noventa e cinco mil reais).

§3º Não serão aceitas despesas de elaboração, agenciamento e administração dos projetos.

§4º Os proponentes poderão ser remunerados desde que prestem serviço na execução do projeto e que o mesmo esteja especificado no plano de trabalho e seu valor não ultrapasse 10% do valor total do projeto.

Editais completos disponíveis no seguinte link http://cultura.jaraguadosul.com.br/index.php

Criam um fundo, tem mais de 1 milhão de reais para distribuir em projetos, e não sabem o que fazer?

Agora se eu elaboro um projeto, agencio, e o administro eu não posso ser remunerado por isso. Se eu executar o projeto o Conselho decidiu em limitar o valor do meu trabalho em 10% do valor total pleiteado.

O edital 01 na área de música lançou como valor máximo de projeto R$ 12.825,00 (doze mil oitocentos e vinte e cinco reais). No meu caso se eu elaborar um projeto nesse valor, tanto faz, se for um oficina, workshop, masterclass, recital, clínica ou produzir algum evento, o valor máximo que eu posso receber por esse serviço é de R$ 1.282,50 (hum mil duzentos e oitenta e dois reais e cinquenta centavos).

No Edital 02 o valor limite para projetos na área de música é de R$ 4.950,00, então, se eu propor algum projeto o máximo que eu vou receber por vender a minha ideia para o Fundo Municipal de Cultura é R$ 495,00 (quatrocentos e noventa e cinco reais), menos de um salário mínimo.

Caros conselheiros, vocês acham que alguém vai elaborar algum projeto mirabolante, de caridade por menos de um salário mínimo?

E tem o seguinte detalhe, o nome do proponente é o que literalmente fica na reta, ou seja, na hora da prestação de contas, se a controladoria do município (ou o próprio Conselho) achar que algo não condiz com o que você apresentou o teu nome vai pro ralo...

Vocês não se ligaram ainda que muitos dos proponentes de projetos de editais anteriores são os próprios que elaboram, produzem, agenciam, administram e executam o projeto?

Foi essa a maneira que vocês encontraram para valorizar o nosso trabalho?

Agora eu vou ter que procurar alguém pra ser meu laranja e poder receber uma remuneração próxima do que eu desejo?

Já imaginaram se a Prefeitura lança uma licitação e coloca um item no edital limitando o faturamento da empresa vencedora em 10% do valor total da obra ou do serviço? Haveria participantes?

Os 90% restantes do orçamento do projeto eu vou investir no quê? Aluguel de teatro? Aluguel de instrumento? Transporte? Gasolina? Alimentação? Diária de Hotel? ISS? INSS? Projeto gráfico? Impressão de cartazes? Produtor cultural?

Tem gente na fundação cultural que emite esse tipo de nota (produtor cultural), então foi por isso que limitaram o valor do proponente em 10%? Para obrigarem os proponentes a lançarem o item Produtor cultural e depois termos que correr atrás de alguém que possa emitir essa nota e ter pagar comissão por isso?

A inclusão desse item nos dois editais deixa bem claro o quanto os Conselheiros Municipais de Cultura valorizam os artistas locais! Depois sempre aparece um com aquele discurso de empresário de mesa de bar: Temos que valorizar a produção artística local! Valorizar os jovens, eles são o futuro da sociedade. Valorizar o professor! E blá blá, blá...

Caros conselheiros, se vocês não conseguem tratar os artistas locais como profissionais, poderiam pelo menos nos tratar como empresas prestadoras de serviço cultural, ou vocês acham que eu posso me dar ao luxo de ligar para o meu empresário e pedir pra ele fazer um projeto pra eu me apresentar pelo edital do Fundo Municipal de Cultura?

Continua....