Em 2001, quando ainda
tocava trombone, fui fazer um teste numa banda de baile da região. Um ensaio na
sexta, baile de rei no sábado e no domingo uma domingueira, retorno segunda-feira
de madrugada.
No sábado o baile era no
interior de Ibirama, num salão bem antigo, todo de madeira. Passamos o som e
logo depois o baterista colocou duas panelas com uns fios ligados bem na frente
do palco e falou para o vocalista: Se liga no começo, não fica perto.
Na hora eu não prestei
atenção, pois ficava no canto do palco, ao lado das caixas de som. Tocava em
poucas músicas e pelo que me lembro na abertura do show eu não tinha
participação.
Começa o show, das
panelas saem fogos com mais de 1 metro de altura. O pessoal que estava próximo
ao palco se afastou com um pouco de medo. O fogo não chega a 1 minuto de duração.
A festa começa e vai até umas 4 horas da manhã, sem problemas.
Em 2006 quando fiz meu
recital orientado, no quinto semestre do curso de música, opção percussão, da Universidade
Federal de Santa Maria - RS, eu o comecei com uma obra coral
para marimba. Peça para quatro baquetas chamada A little prayer (Uma pequena oração), da compositora escocesa Evelyn Glennie.
Achei interessante
colocar duas velas sobre o instrumento e tocar somente com essa iluminação.
Claro que precisei de ajuda de algumas luzes do teatro, pois durante a passagem
de som percebi que forçaria muito a visão apenas com a iluminação das velas.
Depois do recital ao
assistir o vídeo notei que após a primeira música as velas não foram apagadas.
Ficaram acesas até se apagarem sozinhas, pois eu tinha acendido dois pequenos
pedaços dentro de pequenos potinhos de alumínio, já que a música era de curta
duração.
Foram duas situações
que foram pensadas apenas no momento. Nenhum responsável alertou para o que
poderia acontecer caso algo desse errado. Muito menos os envolvidos.
Mais de 10 anos depois vejo
com ingenuidade essa atitude de colocar fogos de artifícios em show musicais,
ainda mais num bailão onde quem vai, vai para dançar. É até uma despesa e um
trabalho a mais para a banda, que já não ganha muito.
Hoje em dia as bandas de
baile parecem mais preocupadas com elementos surpresas, em inovar, do que fazer
músicas dançantes.
Na manhã do dia 27
janeiro, quando fui acordado com a notícia que mais de 100 pessoas morreram
numa boate em Santa Maria, a primeira imagem que me veio a cabeça foi a de uma
outra boate, a Ballare, que uma vez após a formatura de um amigo tentamos
entrar. Era 10 de março de 2007.
Chegamos quase uma hora
da manhã e já tinha gente literalmente saindo pela porta. Nessa hora os
seguranças seguravam as pessoas lá dentro para que não saíssem porque era muita
gente mesmo. Não havia mais ingressos.
Meu amigo perguntou
para um dos seguranças se a gente poderia entrar e ele falou que se pagássemos
uns 50 reais (estávamos num grupo de 5 ou 6 pessoas no momento), “por fora” a
gente entrava.
Falei pra ele: Entrar
como? Não cabe mais ninguém aí! Fomos sensatos, ficamos um tempo no lado de
fora e depois fomos embora.
Pena que a maioria não
pensa assim. Balada boa é a que está lotada. Quem entra em balada, festa, show,
ou em qualquer ambiente público e fica reparando em detalhes de segurança passa
a ser chamado de detalhista estressado.
Certa vez um morador da
Casa do Estudante Universitário da UFSM, onde morei por 4 anos, mandou uma
carta para o Diário de Santa Maria denunciando todas as irregularidades não só
do prédio como dos moradores.
Não pagávamos nem
água, nem luz, muito menos aluguel, tinham pessoas que se aproveitavam disso
para criar um comércio paralelo vendendo comida, lavando roupas e alugando
quartos.
O que aconteceu? O cara
que mandou a carta simplesmente foi ridicularizado, vários moradores ficaram
contra ele e, algumas semanas depois, o vi andando sozinho pelo campus.
Será que ninguém dos
milhares de universitários de engenharia civil, sanitária, arquitetura,
bombeiros, policiais civis, militares e federais que passaram pela boate Kiss
reparou que o lugar não era seguro?
É hora de folga, não de
trabalho.
Ou quem viu ficou com
medo de denunciar? De ser chamado de estressado e responsabilizado por acabar
com a diversão do povo.
Outro detalhe que me
chamou a atenção é que novamente houve greve na UFSM e o calendário acadêmico
atrasou. Na última semana do mês de janeiro as aulas ainda não tinham
terminado.
Ou essa tragédia teria
acontecido em novembro ou dezembro ou iria acontecer. Festa para
arrecadar fundos para formatura acontecendo em janeiro só com quem estuda em
universidades federais.
Todos os anos que
estudei lá ocorreram greve, o curso de música continuava, mas o Restaurante
Universitário e a Biblioteca Central e Setorial fechavam.
Estranhei o fato dos
bombeiros não isolarem a área durante o resgate. Dezenas de voluntários
morreram por falta de informação. Será que ninguém comunicou a eles o risco que
estavam assumindo por ficarem horas respirando fumaça? Não havia máscaras de
gás para distribuir? Porque só os voluntários morreram intoxicados e os
bombeiros não?
Acho que eu não
conseguiria trabalhar vendo um amigo, colega ou voluntário correndo risco de
vida por falta de um equipamento obrigatório para esse tipo de ocorrência.
É esse tipo de
ingenuidade que se torna fatal. Mesmo com todo o trabalho de prevenção que é
feito, ou que se tenta fazer, nunca estamos preparados para o pior.
Não quero tirar a culpa
dos donos da boate, seus currículos já falam por si, e do pessoal da banda. Os
últimos foram ingênuos, os componentes que conheci levavam a banda apenas como
um dinheiro extra e se precisavam acrescentar esses elementos pirotécnicos ao
show é porque a música não era muito atraente.